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Gordon Neufeld |
PORQUE DEVEM OS PAIS PÔR OS FILHOS A CHORAR?*
por
Gordon Neufeld
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A ideia de fazer tudo para que os
filhos sejam felizes, evitando que chorem, está ultrapassada. A teoria de
disciplinar sem que a criança chore está desactualizada, diz Gordon Neufeld,
psicólogo clínico canadiano que esteve em Portugal no final da semana.
“As crianças precisam da
tristeza, da tragédia para crescerem. Precisam de ter as suas lágrimas”,
defende. Nos primeiros meses e anos de vida, o “não” dito pelos pais ajuda a disciplinar,
em vez de estragar a criança. “Estamos a perder isso na nossa sociedade, não
admira que as crianças estejam estragadas com mimos. Afinal, elas são sempre as
vencedoras”, continua o investigador que esteve em Lisboa a convite da empresa
BeFamily, do Fórum Europeu das Mulheres, da Associação Portuguesa de Famílias
Numerosas e da Associação Portuguesa de Imprensa.
Na conferência sob o lema
“Vínculos Fortes, Filhos Felizes”, Neufeld defende que só se atinge o bem-estar
através da educação e que esta deve estar a cargo das famílias e não do Estado.
E para garantir o bem-estar de qualquer ser humano ou sociedade é preciso
preencher seis necessidades.
A primeira é o “aprender a
crescer” e para isso há que chorar, é preciso que a criança seja confrontada,
que viva conflitos, de maneira a amadurecer, a tornar-se resiliente, a saber
viver em sociedade.
A segunda necessidade é a de a
criança criar vínculos profundos com os adultos, estabelecer relações fortes.
Como é que se faz? “Ganhando o coração dos filhos. É preciso amarmos e eles
amarem-nos. Temos de ter o seu coração, mas perdemos essa noção”, lamenta o
especialista que conta que, quando lhe entram na consulta pais preocupados com
o comportamento violento dos filhos, a primeira pergunta que faz é: “Tem o
coração do seu filho?”, uma questão que poucos compreendem, confidencia.
E dá um exemplo: Qual é a
principal preocupação dos pais quanto à escola? Não é saber qual a formação do
professor ou se este é competente. O que os pais querem saber é se a criança
gosta do docente e vice-versa. “E esta relação permite prever o sucesso
académico da criança”, sublinha Neufeld, reforçando a importância de “estabelecer
ligações”.
E esta ligação deve ser contínua
– a terceira necessidade –, de maneira a evitar problemas. Neufeld recorda que
o maior medo das crianças é o da separação. Quando estão longe dos pais, as
crianças começam a ficar ansiosas e esse sentimento pode crescer com elas, daí
a permanente procura de contacto, por exemplo, entre os adolescentes com as
mensagens enviadas por telemóvel ou nas redes sociais, muitas vezes, ligando-se
a pessoas que nem conhecem, alerta o especialista.
O canadiano recomenda que os pais
estabeleçam pontes com os seus filhos. Quando a hora da separação se aproxima,
há que assegurar que o reencontro vai acontecer. Antes de sair da escola, dizer
“até logo”; à hora de deitar, prometer “vou sonhar contigo”.
Mas a separação não é só física,
há palavras que separam como “tu és a minha morte” ou “tu és a minha vergonha”.
Mesmo quando há problemas graves para resolver, a frase “não te preocupes,
serei sempre teu pai” ajuda a lembrar que a relação entre pai e filho é mais
importante do que o problema. Hold on to your kids é o nome do livro que
escreveu e onde defende esta teoria.
A importância de brincar
A quarta necessidade a ter em
conta para garantir o bem-estar dos filhos é a necessidade de descansar. Cabe
aos adultos providenciar o descanso e este passa por os pais serem pessoas
seguras e que assegurem a relação com os filhos.
As crianças precisam que os pais
assumam a responsabilidade da relação, que mantenham e alimentem a relação, de
modo a que elas possam descansar e, nesse período, desenvolver outras
competências. Uma criança que está ansiosa pela atenção dos pais não está
atenta na escola, por exemplo.
Brincar é a quinta necessidade a
suprir. Não há mamífero que não brinque e é nesse contexto que se desenvolve,
aponta Neufeld. E brincar não é estar à frente de uma consola ou de um
computador; é “movimentar-se livremente num espaço limitado”, não é algo que se
aprenda ou que se ensine. E, neste ponto, Neufeld critica o facto de as
crianças irem cada vez mais cedo para a escola, o que não promove o
desenvolvimento da brincadeira. “Os ecrãs estão a sufocar a brincadeira e as
crianças não têm tempo suficiente para brincarem”, nota o psicólogo clínico que,
nas últimas semanas, fez um périplo por vários países europeus, tendo sido
ouvido no Parlamento Europeu, em Bruxelas sobre “qualidade na infância”.
Por fim, a sexta necessidade é a
de ter capacidade de sentir as emoções, de ter um “coração sensível”. “Estamos
tão focados em questões de comportamento, de aprendizagem, de educação; em
definir o que são traumas; que nos esquecemos do que são os sentimentos. As
crianças estão a perder os sentimentos quando dizem ‘não quero saber’, ‘isso
não me interessa’, estão a perder os seus corações sensíveis”, diz Neufeld.
Em resumo, é necessário que os
pais criem uma forte relação emocional com os filhos, de maneira a que estes
sejam saudáveis. Os pais são os primeiros e são insubstituíveis na educação dos
filhos e são eles que devem ser responsáveis pelo seu desenvolvimento integral
e felicidade. Se assim for, estarão também a contribuir para o bem-estar da sociedade.
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*Artigo retirado da revista Life&StyleFamília e relações
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