O ZAROLHO

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Foi há poucos dias. Como sempre, a chegada à sala propiciou a normal saudação:

- Bom dia!

- Bom dia, sr. professor!

Naquela manhã, porém, havia algo que destoava da rotina. Em cima da secretária encontrava-se um esqueleto, de proporções consideráveis, que impressionava pelo inesperado. Era o Zarolho, esclareceu o Duarte, que o tinha trazido de casa com a devida permissão. Chamava-se assim porque o Mateus, o seu irmão mais novo, lhe tinha sumido um olho. E o facto, claro, suscitou alguns gracejos entre os colegas.

Mas os risos demoraram pouco. Andávamos às voltas com o estudo do corpo humano, e o Zarolho, com mais ou menos olho, veio dar uma preciosa ajuda na complementação da teoria. Ali estava ele, imóvel, disponível para ser manuseado. 

Os dias foram passando. Estudou-se o sistema digestivo, depois o circulatório, para a semana entra-se  no sistema respiratório. E o Zarolho sempre ali, com os órgãos no devido lugar, à disposição de qualquer olhar ou vontade manipulativa. A sua presença ultrapassou as fronteiras da mera aprendizagem e, quase sem se darem conta, tornou-se uma figura familiar para os alunos. O Zarolho, aparentemente, parece já fazer parte da paisagem diária. Até ao dia em que, inevitavelmente, terá que partir, pois o Mateus já lhe deve sentir a falta.

Obrigado, Duarte!

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